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Direito do Trabalho

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[02/12/2020 - 15:49] Vendedora de publicidade tem vínculo reconhecido com grupo de comunicação para o qual atuou


Na decisão, Justiça reconheceu que a empresa praticou fraude conhecida como "pejotização" para não pagar os direitos trabalhistas

Uma trabalhadora que atuou por quase três décadas com a venda de anúncios publicitários para um grupo de comunicação, em Cuiabá, teve reconhecido o vínculo de emprego de todo o período e, com isso, o direito de receber verbas como férias, 13º salário e FGTS.

O reconhecimento da relação de emprego ocorreu após a Justiça do Trabalho concluir que o caso foi uma típica prática denominada de "pejotização", quando o empregador exige que o trabalhador (pessoa física) abra uma firma (pessoa jurídica) para prestar serviços e assim camuflar o vínculo de emprego e se esquivar de pagar os direitos trabalhistas.

Ela relatou, à Justiça, que começou a trabalhar para o grupo em maio de 1990 na função de contato publicitário, seguindo-se sucessivas contratações e dispensas até que, em 1998, foi-lhe imposta a necessidade de constituir uma pessoa jurídica, por meio da qual permaneceu prestando os mesmos serviços até abril de 2019.

Proferida na 6ª Vara do Trabalho de Cuiabá, a sentença concluiu - com base em documentos, relatos de testemunhas e até o depoimento do representante da empresa - que a relação possuía todos os requisitos característicos de uma relação de emprego, incluindo onerosidade, pessoalidade e subordinação.

Isso porque ficou comprovado o pagamento de comissões, a existência de metas e premiações aos vendedores que prestavam contas a um superior, inclusive em caso de afastamento para tratamento médico. Os contatos publicitários também utilizavam e-mail e crachá corporativo, além de que participavam de reuniões e cursos por determinação da empresa. Eles podiam, ainda, aderir ao mesmo plano de saúde dos empregados (contrato que, inclusive, era pago pela empresa) e utilizar outros convênios, como postos de gasolina e supermercados. Além disso, o próprio representante da empresa disse, em audiência, que os vendedores tinham de ter CNPJ para iniciar os trabalhos.

Diante das provas, a juíza reconheceu a fraude na contratação da trabalhadora como pessoa jurídica, "sendo evidente que a conduta das reclamadas visava impedir a incidência de obrigações e direitos trabalhistas", finalizou. A magistrada também concluiu pela unicidade dos contratos, de 1990 a 2019.

O grupo de comunicação recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT/MT), reiterando o argumento de que há muitos anos a trabalhadora prestava serviços de forma autônoma. Antes disso, afirmou ter ocorrido dois contratos de trabalho, mas que o último foi extinto em 1998. Desse modo, qualquer eventual direito trabalhista já estaria prescrito.

Subordinação jurídica

Os argumentos, entretanto, não convenceram os julgadores da 2ª Turma do Tribunal que, por unanimidade, mantiveram a sentença. Seguindo o voto do relator, desembargador Roberto Benatar, a Turma avaliou que ficou provada a prestação dos serviços com os requisitos do vínculo de emprego, incluindo a subordinação jurídica, bem como a ocorrência da "pejotização" como subterfúgio à descaracterização da relação de emprego.

O relator enfatizou o conteúdo dos e-mails, com termos como "convocação" para reunião, "presença indispensável", bem como determinação para que seja "colocado na agenda" treinamento a ser realizado, expressões que denotam obrigatoriedade de comparecimento.

Essas e outras condutas reveladas pelos e-mails enviados pela empresa não deixam dúvidas, conforme o relator, do exercício do poder diretivo do empregador de orientar, coordenar e estabelecer a forma da prestação dos serviços. Por tudo isso, o julgador concluiu estar configurada a subordinação própria das relações de emprego, "evidenciando que a recontratação de trabalhadora anteriormente dispensada, ainda que sob vestes de pessoa jurídica, materializou fraude aos diretos trabalhistas da obreira ("pejotização")".

FGTS e outros direitos

Com a decisão, o grupo de comunicação terá de pagar as parcelas inerentes ao vínculo de emprego, como férias e 13º salário, desde outubro de 2014 até a rescisão do contrato, em abril de 2019. As parcelas anteriores já estão prescritas e não podem mais ser exigidas.

A trabalhadora terá direito ainda ao pagamento de 90 dias de aviso prévio, considerando que o contrato de trabalho durou mais de 28 anos, e ao seguro-desemprego, já que ficou reconhecido que o fim do contrato se deu sem justa causa e por iniciativa do empregador.

A empresa também terá de arcar com os valores correspondentes ao FGTS de todo o contrato (1990 a 2019), inclusive com acréscimo de 40%, em razão da dispensa sem justa causa.

Por fim, como consequência da procedência total dos pedidos da ação, a empresa terá de pagar os honorários ao advogada da trabalhadora, fixado em 10% sobre o valor da condenação.

Após a decisão do TRT, o grupo de comunicação chegou a apresentar recurso de revista, pleiteando que o caso fosse julgado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), em Brasília. Entretanto, o recurso não foi admitido, por não cumprir os requisitos para a reanálise do caso.

PJe 0000820-73.2019.5.23.0006

FONTE: TRT- 23ª Região






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